O Ministério da Economia apresentou ao Congresso Nacional (25/6/21) o Projeto de Lei 2.337/21, que trata da 2ª fase da reforma tributária. Ao contrário da 1ª Fase, que propôs a substituição dos tributos indiretos PIS e COFINS pela Contribuição de Bens e Serviços (CBS) com alíquota de 12% e possibilidade de um tímido crédito sobre os insumos, o atual PL tem na sua essência o objetivo de transformar drasticamente o Imposto de Renda para as Pessoas Físicas, Empresas e Investimentos.
Neste artigo vamos abordar de forma prática quais serão os principais impactos decorrentes das mudanças propostas, destacando os principais pontos positivos e negativos que afligem as empresas do Lucro Real e Presumido.
Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Imposto de Renda sobre dividendos
O PL ressuscita a tributação dos lucros e dividendos através de uma alíquota de 20%, o que não é algo novo, pois essa taxação já existia no Brasil até 1995, quando, porém, o percentual era de 15%. No meu entendimento não há nada de errado em tributar os lucros ou dividendos, desde que haja uma compensação justa e equânime através da diminuição dos tributos corporativos.
Todavia, como moeda de troca, o governo ofereceu uma homeopática diminuição gradual na alíquota básica do Imposto de Renda sobre o lucro das empresas (IRPJ) de 15% para 12,5% em 2022, e que culminará em 10% em 2023. Entretanto, são mantidas intactas as regras do adicional do IRPJ, ou seja, o seu percentual de 10% e o limite anual de R$240mil (congelado há 26 anos) para o disparo do seu gatilho permanecem inalterados.
Considerando o exemplo de uma empresa com lucro de R$10milhões, o cálculo do adicional de IRPJ seria: (R$10milhões — R$240mil) = R$9.76milhões x 10% = R$976mil, que equivaleria a 9,76%.
Em termos práticos, como o lucro anual da maioria das médias e grandes empresas é bem superior a R$240mil, esse redutor é praticamente inócuo, o que faz com que a taxação do adicional de IRPJ seja recorrentemente próxima de 10%. Assim, a alíquota total do IRPJ destas empresas diminuiria de 25% (15% IRPJ + 10% Adicional de IRPJ) para 20% em 2023 (10% IRPJ + 10% Adicional de IRPJ) .
Não obstante, as contas não param por aí, pois, sobre o lucro das empresas, ainda deve ser acrescentado o cálculo a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) , cuja alíquota básica é de 9%, e de 20% para os Bancos.
Resumindo, o total dos tributos diretos IRPJ e CSLL passariam dos atuais 34% para 29% em 2013, e, no caso dos bancos, de 54% para 49%.
Contudo, quando colocamos na balança a tributação de 20% dos dividendos, inferimos que a troca não foi nada justa, conforme o exemplo a seguir (considerando que 100% dos lucros foram distribuídos e não levando em conta o caso dos bancos) que adota a mesma premissa de uma empresa com lucro real anual de R$10milhões.
Esse breve cálculo demonstra claramente que no exemplo mencionado, haverá um incremento na tributação geral de R$1.120.000,00 em 2022 e R$920.000,00 em 2023, ou seja, uma majoração tributária geral de 32,94% e de 27,06%, respectivamente, o que não confirma o discurso do governo de que haveria uma contrapartida justa entre a redução do IRPJ e a volta da taxação dos dividendos.
Outra questão controversa sobre a tributação dos dividendos gira em torno do início e da forma de sua incidência. O PL menciona que os lucros serão tributados em 20% a partir de 1º janeiro de 2022 indiscriminadamente, o que fere o princípio da anterioridade, cuja regra determina que lucros auferidos em períodos anteriores a 2022 não poderiam ser objeto de tributação.
Para ilustrar esse entendimento, em 1996, quando os lucros e dividendos deixaram de ser tributados, o princípio da anterioridade foi respeitado, como pode ser observado na descrição padrão impressa nos informes de rendimentos que recebemos das empresas, cujo texto menciona o seguinte: “Lucros e dividendos, apurados a partir de 1996, pagos por pessoa jurídica (lucro real, presumido ou arbitrado).
Seguramente, se a tributação dos dividendos avançar da forma proposta, haverá um aumento enorme no contencioso tributário, no qual os contribuintes que se sentirem prejudicados procurarão a justiça na defesa de seus direitos. O que vai na contramão da simplificação e desjudicialização pretendida pelo governo.
No seu artigo 2º, o PL 2.337/21 propõe a eliminação da dedutibilidade dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), que funciona como uma espécie de redutor do lucro tributável das empresas do Lucro Real que o adotam, pois é alocado como uma despesa financeira.
Deste modo, a indedutibilidade do JCP impacta negativamente no lucro líquido das empresas, sobretudo daquelas de grande porte, que utilizam recorrentemente o JCP como um instrumento econômico-tributário para maximizar os seus lucros e remunerar os seus acionistas.
Entretanto, como vimos no tópico anterior, a reforma tributária também determina a redução do IRPJ em 5 pontos percentuais para o ano de 2023, o que nos induz a fazer uma outra avaliação a fim de verificar se essa compensação foi justa.
Para tal análise, nos baseamos num estudo realizado pela XP Investimento, publicado em 29/06/2021, que teve como premissa os resultados das empresas listadas em bolsa que estão sob sua cobertura nos anos de 2019 e 2020.
O referido estudo apontou que na maioria dos casos o impacto é nocivo, pois algumas empresas teriam os seus lucros afetados negativamente em mais de 10%, ao passo que pouquíssimas empresas seriam beneficiadas com esse “trade-off”.
Aliado aos argumentos apresentados, também gostaríamos de ressaltar que, para manter o mesmo nível de lucratividade, as empresas que usufruem atualmente do mecanismo do JCP poderão forçosamente substituir esse instrumento por algum tipo de alavancagem mesmo sem ter essa necessidade, buscando crédito junto a instituições financeiras, uma vez que os encargos financeiros dos empréstimos são dedutíveis, o que, em tese, neutralizaria a indedutibilidade do JCP.
Porém, essa alternativa pode trazer mais riscos desnecessários às empresas, não sendo benéfica para o mercado em geral. Assim, também nessa temática não enxergamos uma troca justa entre a diminuição do IRPJ e a eliminação de dedutibilidade do JCP, o que contraria a alegação do governo de que não haveria perdas e/ou aumento da carga tributária para as empresas.
Ft: contábeis