O ano de 2023 terminou com um rombo de R$ 230,5 bilhões nas contas do governo
A equipe econômica do governo mantém a promessa de que vai entregar déficit zero em 2024, economistas duvidam e pedem corte de gastos. Em resposta, o governo fala em reduzir desonerações, mas setores resistem.
Está criado um impasse e dos grandes. É urgente que os dois lados recuem. Sendo assim, o governo precisa pensar seriamente em cortar gastos e os setores da economia precisam rediscutir desonerações.
O ano de 2023 terminou com um rombo de R$ 230,5 bilhões nas contas do governo. Foi o segundo pior resultado da história só inferior à pandemia. No entanto, o número grita porque mostra que o problema fiscal está, infelizmente, longe de ser resolvido.
O principal pilar do plano de recuperação fiscal da atual equipe econômica é baseado na arrecadação. A intenção é arrecadar mais e, assim, cobrir parte desse rombo com bilhões de reais extras dos impostos. Matematicamente, aumentar receitas melhora o resultado. Mas será que é possível?
Fernando Haddad, ministro da Fazenda, tem enfrentado uma resistência praticamente intransponível entre os pagadores de impostos. Aliás, quando não se consegue ultrapassar um obstáculo em uma jornada, é preciso mudar de caminho. Haddad deveria fazer isso, e com uma tesoura.
Há uma semana, o ministro da Fazenda disse que topa discutir corte de gastos, desde que a discussão comece pelo “andar de cima”.
A frase foi seguida por duas dicas importantes: o Ministério da Fazenda e a Controladoria Geral da União (CGU) entregaram o endereço de dois desses andares altos.
Governo de gastos
Primeiro, o andar do Judiciário. Estudo do Tesouro Nacional mostrou que a Justiça brasileira é a mais cara do mundo. Em uma comparação entre 53 países, os tribunais brasileiros têm, de longe, a mais elevada conta: 1,6% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano. A despesa média dos demais emergentes é de 0,5% do PIB e dos desenvolvidos, de apenas 0,3%.
Esse andar alto da Justiça gasta mais de 80% do orçamento anual de R$ 160 bilhões apenas em salários e bonificações, uma proporção muito superior à média dos demais países do estudo.
Assim, o Tesouro apontou para o andar e até o cômodo onde a tesoura dos gastos públicos poderia trabalhar. Haddad deveria avançar com a discussão sobre o orçamento dos tribunais, segmento do setor público que passou longe da magreza financeira vista em outras áreas.
É só dar uma volta por Brasília para perceber que o cafezinho cortado nos ministérios segue quente e abundante nos tribunais.
Outro andar ainda mais alto é o das desonerações.
Um louvável esforço da Receita Federal com a CGU criou área no Portal da Transparência com o detalhamento das renúncias e benefícios fiscais. Aliás, os números são exuberantes: R$ 215 bilhões em impostos que o governo deixa de cobrar ou oferece em incentivos aos mais diversos setores da economia.
Passo pra trás
Só para citar os cinco primeiros: R$ 77 bilhões em Cofins vinculados à importação, R$ 48 bilhões em Imposto de Importação, R$ 41 bilhões em Imposto de Renda no Norte e Nordeste em programas da Sudam e Sudene, R$ 21 bilhões em Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e R$ 16 bilhões em PIS de importados.
Tantos bilhões não arrecadados por alguma decisão tomada no passado muito provavelmente justa. Mas, desde então, nenhum governo faz seriamente um acompanhamento da qualidade desse gasto tributário.
É preciso entender se os benefícios à sociedade e à economia continuam. Se o impacto positivo sumiu, é preciso cortar. Mas dessa tesoura muita gente não quer nem ouvir falar.
São mais de 20 mil empresas com algum tipo de benefício tributário. Entre elas, 27 têm mais de R$ 1 bilhão em benefícios tributários. Juntas, gozam de R$ 102 bilhões em renúncia do Estado brasileiro.
Assim, se Haddad propuser um corte de gastos eficiente e racional no Orçamento, faltarão argumentos para o setor privado interditar o debate da desoneração.
Se o setor privado propuser um corte de benefícios tributários eficiente e racional, faltarão argumentos para Haddad interditar o debate sobre o corte de gastos.
Portanto, é urgente dar um passo atrás.
Fontes: cnn, portalcontábilsc, senadofederal