Saindo do nicho de luxo, a moda digital presente no metaverso também chegou às fast fashions, em coleções e desfiles
Nova York, Londres, Milão, Paris e, em 2022, a moda invade o Metaverso. As mais prestigiadas grifes de roupa do mundo agora desfilam suas criações também no metaverso, o novo destino “it” da moda. Um dos marcos recentes dessa empreitada foi o Metaverse Fashion Week, da plataforma de realidade virtual Decentraland, um mundo virtual aberto que funciona no blockchain de Ethereum, que aconteceu no fim de março.
A maior semana de moda totalmente digital até o momento reuniu consagradas grifes, como Tommy Hilfiger, Dolce & Gabbana e Elie Saab, e nativas digitais, como The Fabricant, Auroboros e DressX.
Com mais de 60 marcas, artistas e designers participantes, o evento trouxe, ao longo de quatro dias, diversos desfiles, palestras, pós-festas, ativações imersivas e lojas pop-up, com as grifes exibindo looks digitais em avatares nas passarelas virtuais.
Mercado da Moda
“O mais interessante na MVFW é a grande adesão de marcas muito amplas e com uma participação expressiva no mercado tradicional a um varejo digital, numa nova dinâmica.
Os consumidores puderam comprar peças exclusivas para os seus avatares, e também itens físicos, adquiridos dentro do metaverso e entregues presencialmente”, destaca Carol Garcia, professora do curso de design de moda da Belas Artes.
O evento veio na esteira de uma série de incursões da indústria da moda ao metaverso. Especialmente nos últimos dois anos, e um maior interesse pelos non-fungible tokens (NFTs).
Os tokens não fungíveis, na tradução em português, são uma espécie de certificado de autenticidade e propriedade de bens digitais, baseado em blockchain, permitindo que os artigos virtuais se tornem únicos.
Grifes
Nesse período, a Balenciaga, por exemplo, criou um jogo exclusivamente para apresentar sua coleção e, na sequência, fechou uma parceria com o Fortnite, game online que é fenômeno global, para vender roupas (ou skins) para os personagens dentro da plataforma.
Outras marcas conceituadas, como Louis Vuitton, Gucci, Burberry e Prada, também foram por esse caminho vestindo digitalmente personagens de videogames.
Além disso, entre outras ações nessa direção, Gary James McQueen fez seu primeiro desfile virtual; Balmain lançou uma coleção de NFTs em parceria com a Barbie; Nike adquiriu a empresa de sneakers digitais RTFKT, bem como, a Adidas se juntou a três grandes nomes do mercado de NFTs; e Dolce & Gabbana, com o marketplace de luxo UNXD, leiloou uma coleção de nove peças NFT (cinco delas também físicas) pelo equivalente a 6 milhões de dólares, sendo considerados os tokens de moda mais complexos criados e oferecidos até agora.
Sendo assim, esse cenário tem influenciado também as semanas de moda tradicionais, que estão adicionando elementos imersivos ou de realidade aumentada à experiência da passarela. Um exemplo é a estreia de uma linha de prêt-à-porter puramente digital da inovadora Auroboros na London Fashion Week deste ano.
Outro caso, na Semana de Moda de Nova York, foi a apresentação da coleção de wearables digitais de Jonathan Simkhai na plataforma Second Life. Dessa maneira, um dia antes das versões físicas, em um desfile com 11 looks do designer reimaginados virtualmente para o metaverso.
Além das roupas, entre os convidados VIP estavam modelos, influenciadores, celebridades e jornalistas especializados — todos com seus avatares personalizados vestindo peças de Simkhai.
A moda imersiva no Brasil através do Metaverso
Há dois anos o mercado nacional já dava seus passos na moda digital com a primeira edição do Brazil Immersive Fashion Week (BRIFW). Em síntese, com dezenas de marcas, designers independentes e palestrantes, a semana de moda foi um dos primeiros cases que abordaram o tema no mundo.
Desse modo, entre os designers que se apresentaram está o carioca Lucas Leão, que desde 2018 produz peças com intervenções digitais, como estampas e avatares, filmes em 3D e realidade aumentada.
Anteriormente, em abril do ano passado, o estilista lançou uma coleção de peças digitais e com realidade aumentada no marketplace Shop2gether. Dessa forma, ao comprar os looks, como uma jaqueta puffer e um vestido, o cliente enviava uma foto para que os looks digitais fossem manipulados ao seu gosto na imagem.
O universo digital na moda
Segundo o pesquisador de tendências do universo digital, a cada ano Leão traz um novo conceito para suas apresentações. “Para este ano, quero que haja trocas entre o espectador e a peça física. Além disso, com interação com sensores, por exemplo, para que as pessoas possam sentir frio ou calor”, comenta.
Contudo, saindo do nicho de luxo, a moda digital também chegou às fast fashions. No final de março, a Renner apresentou sua coleção de outono/inverno com novos recursos possíveis pela tecnologia. Em vez de uma passarela tradicional, as peças desfilavam sem corpos através dos óculos de realidade aumentada. Porém, as roupas foram comercializadas no formato físico.
Para Fernando Hage Soares, coordenador do curso de moda da Faap, a digitalização das semanas de moda, que antes eram eventos exclusivos para jornalistas e compradores, agora se tornou uma oportunidade de contato direto com os consumidores finais da marca.
Além da Renner, a marca de calcinhas absorventes Pantys entrou no mercado de NFTs ao lançar 33 tokens. As peças, que no mundo físico têm um uso específico, ganharam um valor simbólico no universo digital. Ainda assim, a cada transação feita, com valor a partir de 0,015 ETH, a empresa se comprometeu a doar uma peça para mulheres em situação de vulnerabilidade social.
Novo cenário para os negócios da moda com o Metaverso
Esse movimento demonstra o lugar que o universo digital já ocupa em nossa cultura atual, inclusive na moda. “O aumento da ‘vida digital’ vem acontecendo em nossa sociedade desde que os smartphones se popularizaram. E, com a pandemia, fomos ainda mais impulsionados a criar uma presença digital”, observa Soares.
Portanto, se a tendência continuar, será que, no futuro, a moda será mais feita de pixels do que de tecido? Ninguém sabe ao certo. À medida que esse espaço emergente vai sendo explorado, as marcas estão descobrindo o que funciona ou não. Do mesmo modo, o que o mercado fashion já sabe é que há muitas oportunidades na mesa para correr o risco de ficar para trás. Além de trazer diversas possibilidades para entregar experiências completamente diferentes ao consumidor, esse universo abre um novo horizonte de negócios.
Fonte: Índices Bovespa