Opinião
Em paralelo às imprescindíveis reformas estruturais, como a tributária e a administrativa, a educação é outra prioridade a ser atendida com urgência pela União, estados e munícios, que compartilham responsabilidades nessa área decisiva para definir o Brasil que teremos nas próximas décadas. É preocupante constatar que, 194 anos após o decreto de D. Pedro I, de 15 de outubro de 1827, que instituiu a Lei Geral relativa ao Ensino Elementar, ainda tenhamos resultados pífios de nossos alunos em rankings internacionais, milhões de crianças e jovens fora da escola e sem acesso à universidade.
Embora o enfrentamento da pandemia seja prioritário, não podemos postergar mais as soluções definitivas para os gargalos que impedem nosso desenvolvimento. Um deles, com certeza, é o ensino. O novo coronavírus agravou um problema que já era insustentável, conforme se observa no “Relatório de Monitoramento Global da Educação 2020: inclusão e educação, todos, sem exceção”, apresentado recentemente pela Unesco.
O estudo reporta o aumento da exclusão durante a pandemia e estima que cerca de 40% dos países de renda baixa e média-baixa não apoiaram os estudantes desfavorecidos durante o fechamento temporário das escolas. Preconiza, ainda, que, no momento da reabertura das escolas, as nações deem atenção aos que foram deixados para trás, visando promover sociedades mais resilientes e igualitárias. Na América Latina, cerca de 60% dos países têm uma definição de educação inclusiva, mas apenas 64% dessas definições cobrem vários grupos marginalizados. Ou seja, a maioria dos países, dentre eles o Brasil, ainda não adotou um conceito amplo de inclusão.
Outro estudo, este do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) revelou que nosso país tem 1,4 milhão de crianças e adolescentes entre 6 e 17 anos fora da escola. Ademais, 5,5 milhões de brasileiros nessa faixa etária não tiveram atividades escolares em 2020 por causa da pandemia. Os dados, extraídos de levantamento feito pelo IBGE, mostram que o percentual de estudantes de seis a 17 anos que não frequentavam a escola foi de 3,8% (1,38 milhão), superior à média nacional de 2019, de 2%.
Os equívocos do passado e do presente, evidenciados nessas e em numerosas outras estatísticas, nos causarão sérios danos, como já tem ocorrido, em curto, médio e longo prazos. A competitividade da economia e aumento da renda dependem fundamentalmente do ensino de qualidade, em todas as suas etapas, num modelo no qual os sistemas público e privado devem complementar-se para atender a todas as demandas da sociedade. Somente as nações que proveram de modo adequado essa prioridade ascenderam em seu desenvolvimento, como se constata em vários exemplos, como os da Coreia do Sul e Singapura, mais recentemente.
A correlação entre educação, crescimento sustentado, renda per capita alta e inclusão socioeconômica já era acentuada. Agora, está se tornando radical, num novo ambiente tecnológico de inteligência artificial, machine learning, internet das coisas, robotização, drones, 5G e todos os processos disruptivos do trabalho que estão mudando a economia, a indústria, o Brasil e o mundo. Enquanto isso, continuamos lamentando que, conforme demonstram vários estudos, a produtividade média de nossos recursos humanos seja de três a quatro vezes menor do que em nações onde o ensino é direito e não privilégio!
Por isso, as políticas de educação, que agora também precisam contemplar ampla inclusão digital dos alunos de baixa renda, em casa e nas escolas, devem ser tratadas diariamente como prioridades, sendo destacadas como manchetes da mídia jornalística, juntamente com a agenda econômica, também relevante, dada a grave crise atual. Precisamos discutir e entender por que os significativos avanços de acesso à Educação Básica e ao Ensino Superior ainda não se materializaram numa oferta qualitativa mais numerosa de novos talentos e profissionais.
É decisivo, portanto, avançar na agenda da educação de qualidade. Sabemos como fazer, como se observa nos sistemas das escolas do Sesi, Senai e outras do Sistema S. Há, ainda, muitas iniciativas e investimentos privados na área do ensino, como o Todos pela Educação, mas isso tem de ganhar escala na sociedade, tornando-se um tema de interesse nacional, que sensibilize corações e mentes. O envolvimento das famílias no processo também é necessário, orientando, acompanhando e estimulando a escolaridade das crianças e jovens.
É preciso vontade política e compromisso com as metas de desenvolvimento. Não podemos esperar o fim da pandemia para iniciar a redenção do ensino. A educação precisa ser, mais do que nunca, uma paixão nacional.
*Fernando Valente Pimentel é presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção .
Foto: Divulgação -Fernando Valente Pimentel