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A fazenda Lamastus não exporta café diretamente para o Brasil por dificuldades burocráticas protecionistas usuais de países produtores

AGRO LUXO: Grãos de café do Panamá são item de colecionador

No mercado de cafés especiais, por outro lado, não há um teto de preço

Nas terras altas da província de Chiquiri, no Panamá, crescem em meio à floresta alguns dos grãos de café mais caros do mundo. O recorde é da fazenda Lamastus Family’s Elida State. No dia 7 de setembro, a libra do grão verde foi leiloada a US$ 6.034, o que equivale a US$ 13.408 o quilo — mais de R$ 70 mil.

O valor enche os olhos não só de quem o compara (mesmo que inocentemente) aos cerca de R$ 15 que se paga num pacote de 500 gramas no supermercado brasileiro, como também dos que fazem parte do setor.

Bebida de ouro

“O dinheiro é bom porque conseguimos reinvestir na fazenda, mas o que é mais legal é que isso desperta curiosidade nas pessoas. Elas vão querer ler e conhecer”, afirma Wilford Lamastus Jr., produtor da quarta geração da família premiada que ainda comanda na Cidade do Panamá a cafeteria Sisu, visitada pela reportagem de Nossa em setembro.

O principal motivo que permitiu o país latino, que antes penava para disputar o mercado de commodity com gigantes como o Brasil, tornar-se um dos mais relevantes — e valorizados$s$ — produtores é a planta geisha.

Trata-se de uma variedade rara de café, de origem etíope. Não cresce em qualquer ambiente, possui características sensoriais específicas e dá origem a um café que parece chá, no melhor dos sentidos. Além da cor, possível de notar nas fotos da matéria, a semelhança passa pelo sabor. Imagine assim: em vez do amargor daquele cafezinho preto, preto, a bebida traz um dulçor suave que dispensa qualquer açúcar. Junto disso, exala aromas delicados, de flores, como jasmim e hibisco, e frutas, tipo pêssego e ameixa.

“O geisha é único. Principalmente o panamenho”, diz Boram Um, considerado um dos quinze melhores baristas do mundo e à frente da marca paulistana Um Coffee Co.

Wilford Jr., é claro, concorda:

Certamente, o geisha será para o café o que o bordeaux é para o vinho. Nem todo mundo poderá provar, mas vão saber o seu valor”.

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Grãos de Café do Panamá: Qualidade e preço

Especial vs. commodity

A diferença entre os cafés commodity e especial se sente na boca, mas vai bem além dela.

O primeiro se restringe a dividir os grãos nas espécies arábica e robusta, e foca na quantidade para obtenção de lucros. Igual para todos os produtores, o preço da saca (60 quilos) é diariamente de acordo com fatores como oferta e demanda, flutuação do dólar e clima. Em 22 de setembro, por exemplo, o quilo do arábica custava R$ 21,43 na bolsa. E o do robusta, R$ 12,45.

No mercado de cafés especiais, por outro lado, não há um teto de preço. Para ser considerado como tal, porém, a bebida precisa atingir mais de 80 pontos na avaliação da SCA, Associação de Cafés Especiais fundada nos EUA em 1982 para estabelecer parâmetros de qualidade no setor e viabilizar outro tipo de comércio que não o commodity.

Por essa lógica, há a valorização das variedades e subvariedades existentes dentro de uma mesma espécie. “Geisha é uma variedade de arábica”, explica Gelma Franco, proprietária da rede de cafés Il Barista.

Produtores de alta qualidade conseguem aumentar os ganhos ao enviar seus microlotes para concursos para serem provados, pontuados e, eventualmente, premiados e leiloados.

“Isso está se tornando comum em países produtores, como o Panamá. Torrefações de diferentes países dão lances”, conta Boram.

Fazendas renomadas, caso da Lamastus, também possuem leilões privados. Wilford Jr. diz que entre os interessados geralmente estão empresas dos Estados Unidos, Europa, Oriente Médio e Ásia, como Japão e Taiwan. Aliás, Oorecorde de US$ 6.034 foi após sete horas de leilão.

Por que o grãos de café do Panamá

O famoso terroir

Atualmente, o geisha tem produção em quinze países. No Panamá, foi introduzido na década de 1960 e depois esquecido pela dificuldade de cultivo. A redescoberta aconteceu em 2004 por Daniel Peterson, da Hacienda La Esmeralda.

Após ser vendido a US$ 21, valor absurdamente alto para época, o grupo de produtores da região de Chiquiri se uniu na missão de fazer a plantação vingar. Com mais conhecimento que a geração anterior, eles descobriram que estavam no lugar perfeito para a variedade.

“Todos os fazendeiros começaram a revirar as suas fazendas para ver se achavam. Quem achou, começou a separar as árvores; quem não, procurou sementes para comprar”, diz Wilford Jr.

O terroir tem o favorecimento pela altitude acima de 1.200 metros, pelo solo vulcânico rico em minerais, pela floresta virgem e pela posição geográfica do Panamá, cuja curta distância entre o oceano Pacífico e o Mar do Caribe proporciona ventos em diferentes direções e amplitude térmica.

O que destaca a Lamastus das propriedades vizinhas, segundo Wilford, é a inovação associada ao trabalho humano. “A gente sempre pensa em como podemos melhorar, mas sem usar apenas máquinas”.

A seleção dos grãos, por exemplo, é realizada duplamente. Primeiro mecanicamente e, depois, por todos que trabalham na fazenda. “Demora horas para olhar todos os grãos e retirar os que não estão bons”.

Outro cuidado está no cupping, a prova profissional de cafés. “Antes, eu e meu pai fazíamos. Hoje, temos nove pessoas. Cada uma é especializada em uma parte do processo de produção. Assim, eles conseguem entender como o que estamos fazendo no campo influencia na xícara e apontar as falhas”.

E no Brasil, dá para provar?

De acordo com Wilford, a fazenda Lamastus no Panamá não exporta grãos de café diretamente para o Brasil por dificuldades burocráticas protecionistas usuais de países produtores. “O que pode acontecer é que alguma cafeteria compre alguns microlote por meio de torrefadoras americanas ou europeias”, diz.

Ou seja, se o desejo é provar o geisha feito por ele, o jeito é ir no Sisu, durante uma possível conexão aérea na Cidade do Panamá e pagar US$ 10 pela bebida.

Alternativa é ficar de olho nos estabelecimentos paulistanos que vez ou outra conseguem adquirir a variedade de quem se arriscam no cultivo nacional. “São poucos os produtores no Brasil. Assim, nas nossas fazendas, temos uma pequena parcela de varietais exóticos, como o geisha. Mas não temos resultado ainda”, fala Boram.

“O investimento para adquirir mudas é muito alto e a atenção e manejo na lavoura mais frequente. Além disso, a variedade precisa de cinco a dez anos para se adaptar ao ambiente”, diz Gelma, que entrega por meio do Il Barista os grãos na casa dos clientes (R$ 89, 250 gramas).

“Eu chamo de café de colecionador”.

Fontes: desejoluxo, baristou, uol