A interferência do homem no meio ambiente é a principal relação entre o aparecimento de tubarões nas áreas costeiras de Balneário Camboriú e Recife
Desde agosto, quando a draga passou a operar na megaobra de alargamento da faixa de areia da Praia Central de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, 28 tubarões foram vistos no mar da região, segundo a última atualização do Museu Oceanográfico da Universidade do Vale do Itajaí (Univali).
Em outubro, um surfista relatou ter sentido o animal encostar nas costas dele, enquanto praticava o esporte na orla. Não houve ataque. Aliás, um mês antes, em setembro, outro tubarão com cerca de dois metros de comprimento foi visto nadando junto ao molhe da Barra Sul, onde ocorria a obra.
Com o fim da atividade da draga na região, que bombeava a areia da jazida até a orla, poderá ocorrer uma diminuição dos registros destes animais, conforme o biólogo André Neto.
Entretanto, os incidentes, como chamam os ataques pelo professor do departamento de Ecologia e Zoologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Renato Hajenius Aché de Freitas, são imprevisíveis.
“É impossível prever. No Brasil há poucos incidentes com tubarões, com exceção na área de Pernambuco. Fora isso, são muito raros e continuam sendo. Por isso, o que vimos em Balneário Camboriú foi a aparição de tubarões que provavelmente foram vistos mais em virtude deste momento de obras. Agora, se isso pode ocasionar possíveis incidentes, isso ainda é difícil saber. Se houve mudança no comportamento deles, é algo passar por investigação”, comenta.
Agressivos?
Segundo especialistas e a própria prefeitura da cidade, os registros feitos até agora na cidade se limitam a espécies como o tubarão-martelo-recortado (Sphyrna lewini), tubarão-mangona (Carcharias taurus) e tubarão azul (Prionace glauca), que não são consideradas agressivas ao ser humano e são comuns na região.
Desde a década de 1960 há registro de aparições sem incidentes com tubarões, segundo a prefeitura.
Em Recife, as espécies mais comuns são o Tubarão-cabeça-chata (Carcharhinus leucas) e o Tubarão-tigre (Galeocerdo cuvier). Esses animais são grandes, enquanto que os encontrados no litoral catarinense, em sua maioria, têm porte médio, segundo os especialistas.
Esses animais também podem ser encontrados em Santa Catarina, mas ficam longe da costa, segundo o professor.
“O que a gente tem que investigar e ficar atento é se espécies como tubarão tigre e tubarão cabeça chata [estão aparecendo na localidade]. São espécies que ocorrem aqui e que são mais potencialmente perigosas, porque são animais que investigam mais e [buscam] presas maiores. Aí podem confundir os seres humanos com presas maiores”, disse.
Ainda, segundo o professor Freitas, há uma diferença na plataforma continental do Recife, o que provoca diferentes comportamentos dos animais.
“Na localidade [Recife], o ambiente foi completamente alterado. Os tubarões cabeça-chata deixaram de ter uma área de berçário e de alimentação preferencial. Eles são mais frequentes lá e se aproximam mais da costa. A plataforma continental lá é diferente. As condições oceanográficas são diferentes. O comportamento do animal está atrelado ao ambientes em que ele está. E eles lá acabam caçando mais perto da costa”, explica.
Diferenças
A interferência do homem no meio ambiente é a principal relação entre o aparecimento de tubarões nas áreas costeiras de Balneário Camboriú e Recife, segundo Freitas.
“O que ocorreu no Recife fica claro que houve um soterramento de uma área de manguezal, que fez com que os animais perdessem sua área de berçário e de alimentação e, consequentemente, procurassem uma outra área. Essa aérea foi o Jaboatão dos Guararapes, que está no início da praia da Boa Viagem”, comenta.
Balneário Camboriú
Em Balneário Camboriú também teve alterações. Assim também, a mudança no habitat dos tubarões ocorreu em virtude da ampliação da faixa de areia “que levantou, provavelmente, alimentos”.
“Essa areia ter vindo com matéria orgânica, outros animais se aproximaram e começaram a se alimentar deste recurso e consequentemente predadores de topo, como tubarões e raias, se aproximaram”, explica Renato.
O biólogo André Neto também destaca que há diferença nas espécies de tubarões encontradas nas duas regiões, por exemplo.
“São espécies bem diferentes das que ocorrem no Nordeste do Brasil, mais precisamente em Recife, portanto, não se pode comparar. […] O risco de ataques é muito baixo para o Sul do Brasil. No entanto, os ataques são mais frequentes no Nordeste devido ao comportamento e biologia reprodutiva das espécies locais”, pontuou.
No entanto, casos de aparições em Fernando de Noronha e do incidente em Ubatuba são considerados isolados e ocasionais pelo professor Renato.
“São interferências humanas que podem sim modificar o comportamento destes bichos e a aproximação deles, uma vez que esses animais são oportunistas e investigam o ambiente no qual eles estão”, concluiu.
Fonte: O Sul -Foto: Reprodução