Modelo de trabalho exaustivo nos EUA revive práticas de escravidão moderna chinesa
Nos EUA, algumas startups estão adotando um modelo de trabalho que lembra a escravidão moderna: a rotina começa às nove da manhã, termina às nove da noite e se repete seis dias por semana. Inspirada na “Escala 996” chinesa, conhecida por causar mortes e graves problemas de saúde, essa prática ganhou fama como símbolo de exploração.
Reportagem da revista Wired mostra que startups de Inteligência Artificial no Vale do Silício, nos Estados Unidos, têm adotado jornadas parecidas, ainda que sem usar o nome “996” abertamente. Em algumas empresas, a exigência aparece já na descrição da vaga. Junto com “benefícios” como café da manhã, almoço e jantar servidos todos os dias no escritório. Inclusive no sábado.
A ideia, segundo executivos, é aumentar a competitividade entre rivais nacionais e também com a própria China. Que, contudo, se consolidou como referência em produtividade agressiva no setor.
A escala exige 72 horas semanais e, na China, chegou a ser praticada por gigantes como Alibaba e Tencent
A Suprema Corte do país derrubou a medida e reafirmou que a lei permite, no máximo, 44 horas semanais, com horas extras controladas. Contudo, a decisão veio depois de uma série de denúncias. Como a de um programador de 25 anos que morreu de hemorragia cerebral atribuída ao excesso de trabalho.
Nos Estados Unidos, empresas como a Rilla dizem adotar o regime de forma “voluntária”, segundo a própria startup, e quase todos os 80 funcionários toparam entrar no esquema. Nas vagas divulgadas, a empresa explicitou o cronograma exaustivo, e afirmou que quem não estiver “animado”, não deveria se inscrever.
Para Will Gao, chefe de crescimento da empresa, a prática reflete uma mentalidade comum entre jovens empreendedores. “Existe uma subcultura muito forte e crescente de pessoas, especialmente na minha geração — a Geração Z —, que cresceram ouvindo histórias de Steve Jobs e Bill Gates, empreendedores que dedicaram suas vidas a construir empresas transformadoras. Kobe Bryant dedicou todas as suas horas acordado ao basquete, e não acho que haja muita gente dizendo que Kobe Bryant não deveria ter se esforçado tanto”, disse à Wired.
Trabalho exaustivo
Outras empresas oferecem bônus de 25% no salário e participação societária para quem aceitar, mas nem todos os funcionários concordam em participar. Há quem recuse, alegando que a cobrança é velada e cria um clima de competição extrema. Para especialistas em direito trabalhista, companhias que promovem a 996 estão “totalmente em desacordo” com as leis dos EUA. Embora haja quem acredite que o modelo deve continuar crescendo.
A tendência preocupa especialistas em saúde e direito trabalhista, já que a legislação americana também impõe limites para horas extras que variam de estado para estado. Além do risco de processos, a volta da 996 reacende o debate sobre até onde vai o esforço legítimo. E, onde começa a exaustão que adoece.
Fonte: icl notícias