Aplicativo lidera o número de denúncias recebidas pela SaferNet
Um relatório elaborado pela SaferNet, organização não-governamental que desde 2005 atua na promoção dos direitos humanos na internet, revelou que 1,25 milhão de usuários do aplicativo de mensagens Telegram participam de grupos ou de canais que vendem e compartilham imagens de abuso sexual infantil e de pornografia. Somente uma comunidade ativa contava com 200 mil usuários.
Intitulado “Como o Telegram tem sido usado no Brasil como um espaço de comércio virtual por criminosos sexuais”, o relatório foi enviado nesta quarta-feira (23) à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo, à Polícia Federal e a autoridades francesas que estão investigando diversos crimes no Telegram. Uma dessas investigações levou, recentemente, o presidente e fundador da companhia, Pavel Durov, à prisão na França. Ele responde em liberdade, mas não pode deixar o país.
Entenda sobre o caso dos usuários que compartilham pornografia no Telegram
O relatório que foi entregue hoje às autoridades foi produzido por meio de uma pesquisa em 874 links do Telegram que haviam sido denunciados à Safernet por usuários da internet por conterem imagens de abuso e de exploração sexual infantil. A SaferNet analisou todos estes links e descobriu que 149 deles ainda seguiam ativos, sem terem sofrido qualquer restrição pela plataforma. Além disso, a SaferNet identificou 66 links que nunca haviam recebido denúncias anteriormente e que continham conteúdos criminosos.
“Fizemos um levantamento minucioso dos links de grupos de Telegram que foram denunciados no Brasil, através do endereço www.denuncie.org.br. Que é o canal de denúncias da SaferNet Brasil, no período de 1º de janeiro a 30 de junho desse ano. Desses 874 links, 141 ainda estavam ativos nos meses em que houve a verificação, que foi de julho a setembro. Desses links ativos, nós encontramos 41 grupos em que comprovadamente havia não só a distribuição de imagens de abuso sexual infantil. Mas também a compra e venda. Era uma feira livre, um comércio de imagens de abuso sexual infantil, com imagens reais. Algumas imagens autogeradas e outras imagens produzidas por inteligência artificial”, explicou Thiago Tavares, presidente da SaferNet Brasil.
No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define como crime a venda ou exposição de fotos e vídeos de cenas de sexo explícito envolvendo crianças e adolescentes
A saber, também é crime a divulgação dessas imagens por qualquer meio e a posse de arquivos desse tipo. Contudo, para a Safernet, quem consome imagens de violência sexual infantil é também cúmplice do abuso e da exploração sexual infantil.
De acordo com Tavares, os usuários e administradores destes grupos do Telegram cometeram vários crimes, entre eles, os de compartilhamento e de venda de imagens de abuso e exploração sexual infantil. Além de imagens de nudez e de sexo vazadas sem consentimento e de venda de material pornográfico gerado com inteligência artificial. “É uma verdadeira feira livre do crime digital no Brasil”, definiu o presidente da ONG.
“São vários crimes que estão implicados. O Ministério Público Federal já recebeu toda a documentação que contém as evidências coletadas, incluindo os endereços dos grupos que continuam ativos. É uma verdadeira feira livre do crime digital no Brasil. “Hoje (23), em entrevista à Agência Brasil, ele afirmou que nós também coletamos e identificamos palavras e códigos que os criminosos utilizam para indexar conteúdo de abuso e exploração sexual infantil, além de denunciar conteúdo ilegal relacionado a esse tipo de abuso em diferentes idiomas.”
Partes dos conteúdos publicados no Telegram são bots
Além destes crimes, a SaferNet descobriu que bots publicam parte dos conteúdos ou os vendem usando criptomoedas como pagamento, o que torna ainda mais difícil identificar os criminosos. “Identificamos a existência de bots, ou seja, robôs, dedicados a criar novas imagens mediante pagamento. Você faz o upload, por exemplo, de uma foto de alguém e mediante pagamento, esse robô lhe retorna uma imagem de nudez, ou mesmo pornográfica. Isso mediante pagamento via PIX ou utilizando-se fintechs ou processadores de pagamento espalhados em 23 países. Destes 23 processadores de pagamento conveniados com o Telegram, existem pelo menos cinco empresas sancionadas internacionalmente e que estão processando pagamentos no Brasil”, disse Tavares.
Esses mecanismos que são utilizados para o processamento financeiro das operações no Telegram, alerta Tavares, demonstram “uma flagrante violação às normas do Banco Central” e podem também estar sendo utilizados para lavagem de dinheiro e financiamento de terrorismo no mundo.
“No relatório a gente pede também ao Ministério Público que não só oficie o Banco Central, como também a Estratégia Nacional de Combate à Lavagem de Dinheiro, cuja secretaria fica no Ministério da Justiça e Segurança Pública, para que realize estudos com o objetivo de identificar e propor recomendações para suprir as lacunas existentes na regulação do setor no Brasil para impedir que o sistema financeiro processe esse tipo de pagamento destinado a financiamento de redes de exploração sexual de crianças e adolescentes”.
O Telegram lidera as denúncias recebidas pela SaferNet, englobando não apenas pornografia que usuários compartilham
O Telegram é o aplicativo de mensagens que lidera o número de denúncias recebidas pela SaferNet. Desde 2021, denúncias à ONG apontam o Telegram como um dos dez domínios com mais links associados à pornografia infantil. Há anos, acusam o Telegram de não remover comunidades e usuários brasileiros que praticam crimes como discriminação racial, ataques à democracia, apologia ao nazismo e exploração sexual de crianças e adolescentes.
“O Telegram é uma empresa obscura que opera em escala global. 35 engenheiros tocam a operação que conta com 900 milhões de usuários no mundo todo, segundo o fundador e presidente da empresa. Ou seja, é uma equipe propositadamente e deliberadamente muito reduzida”, disse Tavares. “É uma empresa que tem um comportamento empresarial incompatível com a legislação brasileira, com a Constituição Federal, com o que determina o Estatuto da Criança e do Adolescente e com o que determinam as regras básicas de compliance e de conformidade para a operação e desenvolvimento de atividades econômicas em qualquer país”.
A Agência Brasil procurou o Telegram para se manifestar sobre esse relatório, mas até a publicação desta reportagem não havia obtido resposta da empresa.
Denúncias – É possível denunciar os usuários que publicam pornografia no Telegram
É possível denunciar páginas que contenham imagens de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. Você pode fazer isso na Central Nacional de Denúncias da Safernet Brasil (https://new.safernet.org.br/denuncie). Se houver suspeita de violência sexual contra crianças ou adolescentes, é preciso acionar o Disque 100.
Por fim, a plataforma Telegram também permite que os usuários reportem conteúdos, canais, grupos ou mensagens criminosas. Você pode denunciar o usuário @nome por e-mail para abuse@telegram.org, informando o motivo da denúncia no assunto “Denúncia usuário @nome”. Aguardando, então, a resposta da empresa.
Fonte: Agência Brasil