O governo enviou ao Palácio do Planalto um projeto de lei que prevê nova exceção fiscal para investimentos das Forças Armadas nos próximos seis anos
O governo federal discute uma nova exceção ao arcabouço fiscal para permitir investimentos em programas estratégicos das Forças Armadas, diante do aumento das tensões geopolíticas.
A ideia aventada no governo é enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei complementar tirando R$ 30 bilhões, distribuídos ao longo de seis anos, do limite de gastos.
O governo aplicaria o dinheiro necessariamente na modernização do Exército, da Marinha e da FAB (Força Aérea Brasileira), possibilitando atualizar programas como o Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras), desenvolver o primeiro submarino nuclear brasileiro e renovar a frota de caças com os jatos suecos Gripen NG.
O presidente debateu o assunto de forma reservada com os ministros Rui Costa (Casa Civil), Fernando Haddad (Fazenda) e José Múcio (Defesa). Todavia, nos próximos dias, Lula e seus auxiliares devem retomar a discussão.
Um dos argumentos levantados no governo é que essa alternativa seria mais viável, politicamente, do que a PEC 55 – proposta de emenda à Constituição que garantiria ao Ministério da Defesa, todos os anos, um orçamento equivalente a 2% do PIB.
Apresentada em 2023, essa PEC está travada no Senado
Uma das críticas a ela é criar uma nova vinculação constitucional quando o mantra recente, entre economistas preocupados com o crescimento da dívida pública e com a deterioração dos indicadores fiscais, é a necessidade de fazer desvinculações orçamentárias (como os pisos de saúde e educação).
Segundo relatos feitos à CNN, a equipe econômica reconhece a necessidade de aumentar os investimentos em defesa.
Entende, porém, que o avanço de uma reforma do sistema de proteção social das Forças Armadas e o fim da “morte ficta” (pagamento para famílias de militares expulsos do serviço ou condenados por crimes) deve ser uma contrapartida à eventual exceção do arcabouço.
- Pagamento de precatórios ;
- Gastos decorrentes das inundações no Rio Grande do Sul;
- Combate às queimadas em 2024;
- Restituição às vítimas de fraudes no INSS;
- Incentivos para empresas prejudicadas com o tarifaço dos EUA.
Auxiliares diretos de Lula avaliam, entretanto, que é preciso considerar o sucateamento das Forças Armadas e a crescente dificuldade de cumprir os cronogramas planejados dos projetos estratégicos de defesa, diante do aumento global dos gastos militares.
Governo Federal avalia investimento de R$ 30 bi fora do arcabouço para Forças Armadas, a seguir, confira mais detalhes sobre o projeto
De acordo com o prestigiado Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz, sediado em Estocolmo, as despesas bélicas atingiram em 2024 o maior nível das últimas quatro décadas.
Houve um aumento de 9,4% na comparação com o ano anterior. O gasto total chegou a US$ 2,718 trilhões. Para o Sipri, sigla em inglês do instituto, não existe um fim à vista para a crescente corrida armamentista mundial.
Enquanto isso, no Brasil, os projetos estratégicos de defesa padecem com a insuficiência de recursos.
Na semana passada, em um debate na CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional) do Senado sobre a PEC 55, a FAB indicou uma nova mudança no cronograma de entrega dos caças Gripen ao Brasil.
O tenente-brigadeiro Walcyr Josué Araújo, chefe do Estado-Maior da Aeronáutica, apresentou um calendário atualizado das entregas. O último lote, com cinco aeronaves, foi para 2032.
Até agora, a conclusão do pacote estava prevista para 2027. Dos 36 caças, porém, o tenente-brigadeiro sinalizou que apenas 16 terão chegado ao Brasil nesse prazo.
“Nós fizemos sucessivos termos aditivos. Estamos hoje no 12º, e os senhores veem que já temos a perspectiva de ter a última aeronave em 2032”, disse Araújo aos senadores.
A culpa é da insuficiência de recursos
“A falta de previsibilidade orçamentária faz com que não possamos aplicar os recursos de forma totalmente racional e equilibrada nesse contrato”, disse o oficial.
“Já estamos investindo mais de 13% acima do valor inicial devido à necessidade de reajustes e reequilíbrios. Isso equivaleria, apenas com essa diferença, a adquirir mais seis aeronaves das 36 originalmente contratadas”.
Em junho, a CNN mostrou o atraso na implementaçao do Sisfron e a readequação de cronograma feita pelo Exército diante da escassez de verbas.
O sistema, que busca aumentar a capacidade de vigilância sobre quase 17 mil quilômetros de fronteiras, tinha conclusão prevista para 2021.
Menos de 30% foram efetivamente executados e o prazo migrou para 2039. A última adequação do calendário havia arrastado a implantação do Sisfron para 2035, mas esse ajuste também ficou inexequível.
Até o fim deste ano, pouco menos de R$ 3 bilhões dos R$ 15 bilhões necessários terão sido investidos, segundo dados do Exército acessados pela CNN.
Governo Federal avalia investimento de R$ 30 bi fora do arcabouço para Forças Armadas – Na Marinha, a prioridade é o desenvolvimento do primeiro submarino nuclear brasileiro
O orçamento para o programa como um todo (o que inclui a reta final dos submarinos convencionais), além da construção de um reator nuclear multipropósito em Iperó (SP), se estabilizou em um patamar de R$ 2 bilhões anuais — pouco mais ou pouco menos.
No começo do programa, quando o Brasil viveu um auge de crescimento econômico, chegou a ter quase R$ 4 bilhões por ano. Depois, durante a recessão de 2015/2016, houve uma queda para cerca de R$ 1,5 bilhão. Em seguida, veio a estabilização. Em 2025, voltou para a casa de R$ 2 bilhões.
Conforme relatos feitos à CNN por oficiais da Marinha, apesar da cifra elevada, esse valor seria insuficiente para manter o cronograma de lançamento ao mar do submarino a propulsão nuclear em 2034 ou 2035.
Desse modo, se o governo mantiver o fluxo de investimentos anuais no patamar atual, ele provavelmente levará o plano até o fim da próxima década. Mais perto de 2040
Manter o cronograma de 2034 ou 2035 demandaria, segundo almirantes ouvidos pela CNN, um aporte adicional de pelo menos R$ 1 bilhão por ano. Não é a única ameaça orçamentária aos programas da Marinha.
Por fim, a força naval desativará 43 embarcações – cerca de 40% de sua frota – até 2028, quando elas chegam ao fim da vida útil. Por enquanto, faltam garantias de reposição.
Fonte: cnn